Do bacalhau ao elo

Totalmente avessa à cozinha e sem dotes culinários, me peguei fazendo três receitas da família: pizza com massa de batata, rabanada e bacalhau à portuguesa. Não sei o que deu em mim. Meu tio mandou as receitas pelo WhatsApp e coloquei a mão na massa.

Embora as orientações fossem bastante genéricas, como: vai polvilhando a farinha até a massa ficar boa. Polvilhar quanto? Quando eu sei que a massa está boa? Cozinha o bacalhau com tudo junto. Mas a batata não tem tempo de cozimento diferente do ovo?

No fim das contas, foi pelo instinto. E pelas lembranças. Afinal, eu como isso tudo todo ano, desde que me entendo por gente. Enquanto eu sentia os cheiros e os sabores certos, histórias passavam pela minha cabeça. Histórias da minha infância, da minha vó, da vó dela, do Brasil, de Portugal.

Somos feitos por muitos seres que já passaram por esse mundo. Na mesma época dessas aventuras na cozinha, assisti ao documentário AmarElo, do Emicida. Senti tanto orgulho de ser brasileira, de lembrar do meu avô negro cantando nas rodas de samba com um copinho de cerveja na mão.

Amar realmente é elo. É juntar todas as argolas numa só corrente e deixar fluir aquela obra de arte cheia de cores, curvas, relevos. Trazemos dentro da gente coisas de tanta gente. Veja só: Fritar rabanada tem o poder de resgatar a alegria de ser o que somos e fomos. É uma saudade boa.

Foto autoral. Lembranças do México / Novembro, 2020.

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45 comentários sobre “Do bacalhau ao elo

  1. Alex Antunes

    Interessante como coisas do dia-a-dia podem desencadear lembranças mais profundas.

    Em relação às nossas origens, acho muito interessante conhecê-las. Infelizmente, porém, nem todas as famílias têm essa consciência.

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      1. Alex Antunes

        Não entendi direito, Nicole, o que você quis dizer com “resgatar minhas histórias”. Seria recordar minhas histórias ou algo mais profundo como não perder as histórias do passado?
        Tinha uma época da minha vida em que eu gostava muito de ouvir as histórias da minha avó materna. Ela era um excelente contadora de casos, como dizemos os mineiros, mas, depois de certa época, ela ficou doente, e perdeu o ânimo em contar histórias e aí eu parei também de ouvir as histórias dela.

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    1. hudsoncapanema

      Para quem, há um ano, não sabia fritar um ovo, a tua evolução culinária foi surprendente! Cachorro quente, arroz com camarão e, agora, bacalhau à portuguesa! E que bom que o bacalhau tenha o tempero da tua infância e te remete à lembrança de teu avós! ! Parabéns, espero, um dia, experimentar teus pratos! Bjs

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  2. Ricardo Cunha

    Muito embora eu adore comer, detesto cozinhar. E sobre isto, uma coisa importante: apesar de não alimentar sentimentos ruins, tenho inveja de homens que sabem cozinhar. rs… Pra mim, é um dom. E eu puder imaginar com força o qual saboroso ficou o seu bacalhau.
    Forte abraço e ótimo 2021.

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  3. Alex Antunes

    Uma coisa que eu gostaria de fazer é descobrir minha origens étnicas. Tem um teste de DNA de ancestralidade que permite descobrir isso, mas eu acho relativamente caro.

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    1. Alex Antunes

      Minha avó ainda está viva. Eu coloquei o verbo no passado, porque, desde que ela ficou doente, ela parou de contar as histórias dela. Mas é uma situação que a gente compreende e respeita.
      A ideia do quebra-cabeça é boa. 🙂

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  4. Que lado bom de explorar, Nicole!
    A minha avó materna conheceu Lampião e relata de um modo bem peculiar. Conta cada detalhe e a família que fazia parte cada membro das histórias. É uma gracinha porque na maior parte do tempo não dá para acompanhar tamanha memória.
    Nesta encontro com os cangaceiros, ela diz que sentiu medo porque a trupe chegou e levou a única cabeça de gado que havia um conhecido (em plena seca), enquanto ela se escondia de medo.
    Dá até vontade de sentar ao lado dela agora para escutar novamente.

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  5. Essa má vontade e falta de gosto pela culinária, algo que eu sei muuuuuuito bem o que é, realmente melhora um pouco quando mete o coração nos ingredientes. Este ultimo Natal também senti isso ao fazer uma receita que era da minha mãe. Não saiu mal de todo….mas nunca tem o mesmo gosto, apesar da saudade envolvida. Comidinha da mãe é única.

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  6. Também gosto de ir ao “antigamente” e explorar as histórias de família, aprende-se tanto com elas, traz-nos muita coisa que não sabíamos. Este ano perdi os meus avós e foi um ano a recordar a vida e tempos de antigamente. Pena que não consiga chegar mais atrás nas raízes.
    Quanto à culinária, bem… sou suspeita, invento muito, não sou boa a seguir receitas. eh eh eh.
    Um beijinho grande Nicole e com fim de semana.

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  7. A mente se alimenta de lembranças, especialmente quando elas nos deixam traços agradáveis. E aí o resultado da ousadia com receitas de família. Tenho um filho a viver em Portugal e nas minhas visitas não deixa passar o bacalhau. Bom domingo e excelente semana.

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  8. Bruno Morais

    Sabores, AmarElo e sombra familiar. Vários universos em mais um texto de Nicole. Textos com cheiro, talvez até textura. A vida útil de AmarElo ainda é um enigma, mas eu chutaria até um pra sempre aí visse, assim como a vida útil dos sabores familiares e da sombra daquela lembrança que visita e se revigora!

    Um tanto diurético e bastante saudável seu texto Nicole, um excelente Janeiro a todos nós. Beijão!

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  9. Oi Nicole, seu texto muito bem estruturado envolve a culinária e as lembranças familiares. Dois ingredientes que amo e sempre que posso, trabalho eles em meus textos. Sempre gostei de cozinhar e justamente por ter convivido ao lado de mulheres incríveis na cozinha, acho que acabei assimilando isso. Excelente semana! Bjs

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  10. MARIA JOSÉ ABELHO

    Palavras lindas fez-me lembrar as minhas avós. somos realmente o resultado de muitas pessoas, muitos saberes, sabores e amor. ❤

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  11. Deu até fome rs
    É engraçado como alguns momentos nos teletransportam né?
    No fim, é isso que a gente leva dessa vida louca, os momentos e as lembranças de quem fez parte da nossa história 💕

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